"NEOJIBA busca pedagogia da prática coletiva, por ser mais democrática"

  • 17 fev, 2016
Joel Luis da Silva Barbosa é Professor Titular da Escola de Música da Universidade Federal da Bahia (UFBA) desde 2000, onde atua como vice-diretor e professor de clarineta e música de câmara. Foi premiado com bolsas da VITAE, CNPq e CAPES, através das quais obteve o grau de Mestre e Doutor em Artes Musicais (DMA), em 1992 e 1994, respectivamente, pela University of Washington, Seattle, EUA. Sua dissertação de doutorado é sobre metodologia de ensino em grupo de instrumentos de banda. Como parte de sua dissertação, escreveu o primeiro método de banda brasileiro com esta pedagogia denominado CAPO. Joel Barbosa integrou a programação do VI Seminário Pedagógico do NEOJIBA, realizado no Instituto Anísio Teixeira, em Salvador, de 15 a 17 de Fevereiro de 2016. Durante este encontro, ministrou palestra e realizou aulas práticas sobre ‘Métodos para Educação Musical Coletiva com Instrumentos Musicais Heterogêneos’ (EMUCIM) para músicos e gestores de projetos musicais e Orquestras Filarmônicas sediados no interior do Estado da Bahia. Confira na entrevista, o ponto de vista do músico, educador e pesquisador Joel Barbosa sobre o cenário atual da educação musical no Brasil e no interior da Bahia e as contribuições do programa NEOJIBA neste contexto. Há uma demanda da sociedade pelo retorno da educação musical hoje nas escolas. Há um movimento expressivo nessa direção. Qual a importância da educação musical para a sociedade brasileira? No Brasil como um todo, o grande passo foi a música voltar a ser um componente obrigatório nas escolas. O grande desafio é o espaço adequado para se fazer música nas escolas e o acesso aos instrumentos. Isso ainda vai demorar algum tempo. Neste contexto, programas como o NEOJIBA trazem soluções excelentes, porque você não fica preso aos limites financeiros e de infraestrutura das escolas e pode oferecer desde já uma educação musical de qualidade para quem se interessa. Nos últimos 20 anos no Brasil, surgiram vários projetos de música no Sul do País e também aqui no Nordeste, como o NEOJIBA e o PRIMA. Estes projetos oferecem algo que a escola convencional não consegue dar conta, que é a formação em música instrumental. O desafio é oferecer uma formação musical mais ampla e não apenas o ensino do instrumento. Ser realmente um processo de educação musical. Isto significa conhecer a nossa cultura musical, a cultura musical do outro e desenvolver habilidades como um todo. Não só o domínio técnico do instrumento e a leitura da partitura, mas a criatividade musical na improvisação, na interpretação e na composição. Esse estímulo pode acontecer desde as primeiras notas. Não é preciso que a criança domine um instrumento para compor uma música. Grandes compositores no mundo todo, como Cartola, não sabiam ler uma partitura para escrever, mas já sabiam compor letras maravilhosas, como aquelas que nós conhecemos. Muitos compositores nem sequer tinham dado grandes passos, do ponto de vista técnico da prática do instrumento, para fazer música. Desde o início do aprendizado da música, é importante estimular tocar de ouvido e a criatividade musical. Estes também são componentes importantes para termos músicos mais completos e grupos instrumentais com características musicais próprias, que saibam fazer a nossa música e inventem novas músicas e novos caminhos para nossa música. Como é essa experiência de dialogar com músicos do interior do Estado da Bahia e que não têm acesso a este tipo de formação? O que a música feita no interior do Bahia tem de singular? O povo gosta de fazer música e encontra sua maneira de fazer música. A quantidade de Bandas Filarmônicas que nós temos no interior da Bahia, além de outros grupos instrumentais como samba de roda e grupos de reisados, é um exemplo disso. Há uma riqueza muito grande nesse sentido. As Bandas Filarmônicas da Bahia desenvolveram um repertório próprio com excelentes compositores e inclusive gêneros musicais diversos que só se encontra aqui – não há no resto do País. Neste sentido, sempre que eu tenho oportunidade de ir para o interior ou estar com estes músicos aqui em Salvador – para tocar e aprender um com o outro – é uma chance única. Hoje, realizamos uma troca sobre um processo pedagógico de educação musical coletiva, que não tem sido muito praticada porque não faz parte da nossa tradição. Nos últimos 15 anos, essa metodologia começou a ser difundida no interior do Estado também. Mas agora percebo esse conhecimento atualizado, de como se tocar um instrumento do repertório europeu. Este tipo de repertório nunca esteve tão presente no interior como está agora com o NEOJIBA. O interior tem o seu repertório e suas tradições musicais das bandas filarmônicas, com suas funções musicais. Mas quando você amplia esse horizonte e traz outras maneiras de tocar, de ver e entender a música é muito rico, porque dessa mistura é que surgem novas músicas. Todas as músicas novas que surgiram no mundo são misturas. O frevo é uma mistura. Além do repertório, do ponto de vista da formação qual a contribuição que o NEOJIBA leva para o interior do Estado? O NEOJIBA busca essa pedagogia da prática coletiva, porque é uma pedagogia mais democrática. Além disso, do ponto de vista pedagógico é muito mais eficiente do que a individual, porque ela cria possibilidades de formação musical muito mais amplas para os músicos. A Filarmônica que está sediada no interior, ela ganha ao conhecer isso porque ela pode ampliar o seu número de alunos e ser ainda mais democrática do que ela já é. Claro que tudo precisa ser feito com muito cuidado, porque quando duas culturas musicais se encontram é bom que uma se alimente da outra para gerar uma terceira. A tradição musical europeia que chega com o NEOJIBA – que não traz só esta referência musical, mas principalmente esta - se encontra com a tradição das bandas filarmônicas, que têm outra maneira de tocar e trabalhar com outro repertório. É importante essa convivência, para que ambas cresçam juntas. Como é a sua relação com o NEOJIBA, quais contribuições você já deu ao programa? Eu conheço o NEOJIBA desde o começo, porque eu trabalhava com a Orquestra da Juventude de Salvador, que funcionava lá em Fazenda Coutos, na Suburbana. Eu ajudava a coordenar o grupo de sopros desta orquestra e fazia a coordenação pedagógica geral. Quando o NEOJIBA surge, alguns alunos desta orquestra e também da UFBA passaram a fazer parte do programa. Outros também vierem do Colégio Adventista, que eu tinha contato porque eles usavam meu método. Além disso, muitos colegas da UFBA e da OSBA me convidaram para ministrar palestras e cursos no NEOJIBA ao longo desses anos. Depois, eu participei do processo de constituição do Núcleo de Prática Orquestral e Coral do Bairro da Paz e da Banda Sinfônica da Paz, que integram o NEOJIBA.

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