"Para 2016, planejamos disseminar a imagem do arranjador como educador"
- 02 mar, 2016
Jamberê Cerqueira é o coordenador das tubas do programa NEOJIBA e toca na Orquestra Juvenil da Bahia. Contudo, ele é mais conhecido por ser o principal arranjador do programa. Muitos dos arranjos tocados pelos jovens músicos nos Núcleos são assinados por ele. Jamberê também arranjou peças para a Orquestra Juvenil da Bahia, como o Tico-Tico no Fubá, de Zequinha de Abreu, que a principal formação do NEOJIBA costuma tocar como bis nas apresentações. Além disso, Jamberê é compositor e terá uma de suas obras executadas na Temporada 2016 da Juvenil. Confira a entrevista com o jovem tubista, arranjador e compositor.
Como você se tornou músico?
Comecei a fazer música aos 15 anos na banda do colégio, como trombonista. Através de trilhas sonoras de filmes e jogos, desenvolvi o interesse pela música. Desde então, junto com a iniciação no instrumento, surgiu o interesse de saber como escrever música. Três anos depois, prestei vestibular para composição na UFBA. Dois anos depois, participei da audição para tocar tuba na Orquestra Juvenil da Bahia, pois eu tinha voltado a tocar meu instrumento alguns meses antes, na banda sinfônica da Escola de Música da UFBA.
A minha participação como compositor e arranjador do NEOJIBA surgiu a partir de uma necessidade interna do programa. Sou bacharel em composição. Depois de concluir a graduação, ingressei no mestrado profissional em Educação Musical, também na UFBA. Meu trabalho final foi baseado e voltado ao NEOJIBA. Procurei construir um repertório didático para orquestras e bandas iniciantes e estudar como a composição auxilia e influencia no desenvolvimento da prática instrumental.
Qual a diferença entre o trabalho do compositor e o trabalho do arranjador?
O trabalho do arranjador é bem parecido com o do compositor. A diferença é que o arranjador trabalha a partir de uma música pronta. Na composição, a gente trabalha a partir de uma ideia. Não significa que a composição será 100% original. A própria vivência serve como base para a criação de uma obra.
Como se constrói o repertório dos Núcleos do NEOJIBA?
Nós escolhemos o repertório a partir das demandas apresentadas pela coordenação do Núcleo ou pela direção artística do programa. Geralmente, eu tenho liberdade para propor e sugerir. A partir de uma conversa, busco informações sobre qual grupo irá trabalhar com aquele repertório, se há algo já pensado para adaptar. Costumo consultar os coordenadores e colegas para saber o que eles gostam e também tento trazer um mínimo de ambiência, pois é importante ter esse diálogo através da composição.
Existem parâmetros para escolher qual tipo de obra você vai trabalhar?
No caso dos Núcleos do NEOJIBA depende muito do ambiente em que o repertório será trabalhado. Em um ambiente de escola, por exemplo, o repertório será direcionado com foco no ano escolar. Claro que, como arranjador e compositor, eu busco propor um diálogo com outras linguagens, como por exemplo, a música contemporânea. Mas de forma acessível para quem vai tocar e, principalmente, para quem vai ouvir, para que não soe estranho. Eu tenho esse feedback das pessoas sobre o que funcionou e não funcionou. Esse retorno é bem importante, tanto por parte de quem ouve, quanto de quem toca. Eu gosto de atuar como compositor e arranjador dentro da orquestra e do programa. Sou orientado pela direção e assim vou construindo o meu trabalho. Tento agradar ao máximo possível, sempre pensando em quem vai tocar e em quem vai ouvir.
Qual a diferença em escrever para grupos iniciantes e avançados?
Quando o grupo é iniciante é mais difícil, pois é preciso tomar mais cuidado do ponto de vista pedagógico. Tem uma frase que eu sempre uso: escrever fácil é difícil. Porém escrever difícil é fácil. Eu acabei aprendendo com a experiência que é preciso ter o cuidado de conversar com o professor, com o regente, até com o próprio aluno. Às vezes, ele não sabe tocar a nota ou não tem uma palheta boa ou um arco bom... É importante escrever uma música que soe bem no instrumento. Por exemplo, numa orquestra de cordas iniciante, uma boa estratégia é compor em ré maior. Tem cordas soltas, mas soam bonitas e afinadas. Tem uma série de estratégias para chegar a esse objetivo. Para 2016, planejamos disseminar dentro do programa a imagem do arranjador como um educador, pois uma obra bem arranjada faz muita diferença.
Qual tipo de repertório você gosta particularmente?
Eu gosto de trabalhar com música brasileira do Nordeste. Sempre procuro fazer menções e dar umas pinceladas com esses elementos. No meu mestrado busquei trabalhar esse diálogo entre dois mundos separados geograficamente e no tempo. Você faz uma valsa com elementos afro-baianos; uma marcha que inclui elementos de carnaval...
...e para qual formação?
Eu me sinto bem mais à vontade escrevendo para uma orquestra, do que para um grupo de câmara. Apesar do segundo, ser o mais desafiador. No meu caso, há uma relação de nove anos de confiança com os músicos da Orquestra Juvenil da Bahia. Se acaba tendo uma certa intimidade musical, de como saber lidar; saber agradar em alguns momentos, saber desagradar... Para a Juvenil, eu escrevo quase de olhos fechados, pois conheço muito bem as capacidades técnicas e musicais dos meus colegas.
Como se sente quando você toca a sua própria música na orquestra?
Tocar a música que escrevi é um tormento. Às vezes deixo de prestar atenção na minha parte, não consigo deixar de escutar os outros instrumentos. E como tem uma hierarquia na orquestra, não tenho como me manifestar no meio do ensaio. Às vezes o pessoal se aproxima e tira dúvidas. Eu aconselho... Outras vezes, basta um sinal ou uma piscadinha e eu sei que ficou legal. Como músico da orquestra e não sendo arranjador naquele momento, minha capacidade de atuação é restrita. Não dá para propor um arranjo de forma instantânea. Está escrito no papel e tem que ser aquilo ali naquele momento.